O "ponto de vista conservador" para o casamento homossexual entra em colapso.
Fonte [*]
A conexão Hezbollah-PCC |
Mais precisamente, o
casamento gay está mais do que minando essa instituição. A
separação do casamento e da paternidade e a taxa de natalidade fora
do matrimônio são cada vez maiores, e o casamento gay adiciona
fatores que contribuem para o acréscimo dessas estatísticas. Ao
invés de fomentar um retorno da sociedade para o matrimônio, o
casamento gay passa à população a mensagem que o casamento em si
está ultrapassado, e que virtualmente qualquer tipo de família,
incluindo a paternidade fora do casamento, é aceitável.
Esta não é a forma
pela qual a situação tem sido retratada pelo jornalista Andrew
Sullivan e pelo professor de direito da Universidade de Yale William
Eskridge Jr, proeminentes defensores da união entre pessoas do mesmo
sexo. Sullivan e Eskridge têm dado muita importância a um estudo
inédito sobre uniões homossexuais legalizadas na Dinamarca feito
por Darren Spedale, um pesquisador independente que visitou a
Dinamarca em 1996 para um intercâmbio. Em 1989, o casamento gay foi
legalizado de fato na Dinamarca (o que também ocorreu na Noruega,
em 1993, e na Suécia, em 1994). Se baseando no estudo de Spedale,
Sullivan e Eskridge citam evidências de que, desde então, o
casamento foi fortalecido. Spedale mostra que, nos seis anos
seguintes à legalização do casamento gay na Dinamarca (1990-1996),
os índices de nupcialidade heterossexual cresceram 10%, enquanto os
de divórcio decaíram 12%. Escrevendo na McGeorge Law Review,
Eskridge declarou que o estudo de Spedale expôs a "histeria e
irresponsabilidade" daqueles que previram que o casamento gay
solaparia o tradicional. O artigo de Andrew Sullivan, inspirado no
estudo de Spedale, tem como título: "Os argumentos contra o
casamento homossexual se desintegram."
Entretanto a meia
página de análises estatísticas sobre o casamento heterossexual no
estudo de Spedale não chega nem perto da verdade sobre o declínio
do casamento na Escandinávia durante os anos 90. O casamento
escandinavo é hoje tão frágil que as estatísticas sobre casamento
e divórcio não indicam mais o que elas costumavam ser no passado.
Pegue o divórcio. É
verdade que na Dinamarca, assim como em qualquer lugar na
Escandinávia, os números sobre o divórcio parecem melhores do que
nos anos 90. Mas isso se deve ao fato de que o número de pessoas
casadas vem diminuindo há algum tempo. Você não pode se divorciar
sem antes estar casado . Além disso, um olhar mais detalhado aos
divórcios dinamarqueses na década posterior ao advento do casamento
gay revela tendências assustadoras. Muitos dinamarqueses pararam de
adiar o divórcio até que seus fihos estejam crescidos, e na
década de 90 viu-se um aumento de 25% na coabitação de casais com
filhos. Com poucos pais se casando, o que costumava ser mostrado em
tabelas estatísticas como divórcio precoce é agora a separação
não registrada de casais que coabitam com filhos.
E o que dizer sobre
a informação de Spedale de que a taxa de nupcialidade dinamarquesa
cresceu 10% de 1990 para 1996 ? Novamente, a notícia apenas parece
ser boa. Em primeiro lugar, essa não é uma tendencia. As taxas de
nupcialidade para 2001 recém-lançadas pela Eurostat mostram quedas
na Suécia e na Dinamarca (o índice da Noruega não foi relatado).
Em segundo lugar, as estatísticas de nupcialidade nas sociedades com
índices muito baixos (a Suécia registrou a taxa de nupcialidade
mais baixa da história dessas pesquisas, em 1997) devem ser
cuidadosamente analisadas. Em seu estudo sobre as famílias
norueguesas na década de 90, por exemplo, Christer Hyggen mostra que
um pequeno crescimento na taxa de nupcialidade norueguesa durante a
década passada tem mais a ver com o declinio dessa instituição do
que com qualquer renascimento dela. Muito desse acréscimo das uniões
norueguesas é devido a casais mais velhos "reencontrando-se".
Esses casais pertencem à primeira geração que aceitou cuidar do
primeiro filho sem estar casado. Com a chegada do segundo filho,
alguns desses casais finalmente se casam (E mesmo assim essa
tendência de se casar após o nascimento de um segundo filho está
diminuindo). Quanto ao resto do acréscimo na taxa norueguesa, essa
tendência é amplamente atribuível a um re-casamento entre um
grande número de divorciados.
Os dados de Spedale
sobre menores taxas de divórcio e maiores taxas de nupcialidade na
Dinamarca pós-casamento gay são, portanto, enganosos. Atualmente, o
casamento na Escandináva é uma instituição tão enfraquecida que
mudanças nesses indicadores já não representam o que elas
represantariam nos Estados Unidos. Na demografia escandinava, o que
conta é a taxa de natalidade fora do casamento, e o índice de
dissolução familiar.
O índice de
dissolução familiar é diferente da taxa de divórcio. Devido ao
grande número de escandinavos que agora criam seus filhos fora do
casamento, taxas de divórcio não mais são parâmetros confiáveis
para se medir o enfraquecimento da família. Em vez disso, nós
precisamos conhecer a frequência com que pais (casados ou não) se
separam. Estatísticas precisas sobre a dissolução familiar são
raras, infelizmente. Já os estudos que têm sido feitos mostram que
por toda escandinávia (e o ocidente) casais coabitantes com filhos
se separam com mais frequência (de duas a três vezes mais em
relação aos pais casados). Desse modo, as estatísticas crescentes
de coabitação e de natalidade fora do casamento servem como
indicadores dos aumentos nos índices de dissolução familiar.
Considerando esses
dados, a família escandinava vai de mal a pior. Entre 1990 e 2000, a
taxa de natalidade fora do casamento na Noruega aumentou de 39 para
50%, enquanto na Suécia esse aumento foi de 47 para 55%. Na
Dinamarca os nascimentos fora do matrimônio mantiveram o nível
durante a década de 90 (no início desse período eram de 46% e no
final foram 45% dos nascimentos). Mas o decréscimo parece ser em
função de um leve aumento da fecundidade entre casais mais velhos,
que se casaram apenas depois do nascimento de outros filhos (isso se
eles não se separaram antes). Essa mudança mascara o acréscimo de
25% das estatísticas de coabitação e paternidade de solteiros
durante os anos 90 entre casais dinamarqueses (muitos deles jovens).
Cerca de 60% das crianças primogênitas na Dinamarca têm hoje pais
solteiros. O aumento do número de famílias fragilizadas baseadas na
coabitação e na maternidade fora do casamento denota que, durante a
década de 90, o índice de dissolução familiar total na
Escandinávia cresceu significativamente.
As taxas de
natalidade fora do casamento na Escandinávia podem ter aumentado
mais rapidamente nos anos 70, quando se iniciou a derrocada do
casamento tradicional, mas o fato dessa taxa ter ultrapassado a marca
dos 50% durante os anos 90 foi muito mais pertubador. O aumento da
taxa de natalidade fora do casamento é limitado pela tendência dos
pais se casarem depois do nascimento de alguns filhos, e também pela
persistência de distritos relativamente conservadores e religiosos.
Assim como a paternidade fora do casamento passa dos 50%, ela está
alcançando o mais rigido aspecto da resistência cultural. A
principal tendência da década pós-casamento gay pode ser o fim da
inclinação dos pais para se casar ao nascimento de um segundo
filho. Uma vez que essa inclinação desaparece, o caminho para o
completo desaparecimento do casamento é aberto.
E, agora que a
paternidade no casamento tem se tornado um fenômeno minoritário,
tem-se perdido a massa crítica necessária para que haja uma força
socialmente normativa. Como os sociólogos dinamarqueses Wehner,
Kambskard, e Abrahamson relatam, na esteira das mudanças na década
de 90, "O casamento já não é mais um pré-requisito para se
estabelecer uma família - nem legalmente, nem normativamente. . . .
O que define e fundamenta a família dinamarquesa pode-se dizer se
mudou do casamento para a paternidade."
Portanto a tão
aclamada meia página de análises de um estudo inédito que
supostamente ajudaria a validar o "ponto de vista conservador"
para o casamento gay - ou seja, que seu estabelecimento estimularia a
união estável tanto para heterossexuais quanto para homossexuais -
não siginifica nada. O casamento na Escandinávia está em declínio
intenso, com crianças carregando o fardo dos crescentes índices de
dissolução familiar. E o norteador desse declínio - um acentuado
aumento da separação entre casamento e paternidade - pode estar
ligado ao casamento gay. Para visualizar essa ligação, nós
precisamos entender o porque do casamento estar em maus lençóis na
Escandinávia.
A Escandinávia tem
sido sido um termômentro das mudanças familiares. Estudiosos tomam
a experiência sueca como um protótipo para mudanças familiares que
podem, ou poderiam, se disseminar pelo mundo no futuro. Portanto
vamos dar uma olhada no declínio do casamento sueco.
Na Suécia, como em
todo o mundo, os anos 60 trouxeram os métodos contraceptivos, o
aborto, e um crescente individualismo. O sexo foi separado da
procriação, reduzindo assim a necessidade de casamentos arranjados
devido a uma gravidez indesejada. Essas mudanças, juntamente com o
movimento feminista no mercado de trabalho, permitiram e estimularam
a população a se casar em idades mais avançadas. Com casais
adiando a paternidade, o divórcio precoce teve poucas consequências
para as crianças, enfraquecendo o tabu do divórcio. Uma vez que
casais jovens estavam adiando o nascimento dos filhos, o próximo
passo era dispensar o casamento e a coabitação até que ter filhos
fosse um desejo do casal (os americanos também viveram essa
transformação). Dessa forma, os suecos simplesmente tiraram a
seguinte conclusão final: Se nós chegamos tão longe sem um
casamento, porque casar, afinal? Nosso amor é o que importa, não
um pedaço de papel. Porque filhos deveriam mudar isso?
Duas coisas
impeliram os suecos a aceitar esse passo adicional - o estado de
bem-estar social e o aspecto cultural. Nenhuma economia ocidental tem
maior porcentagem de funcionários públicos, gastos públicos - ou
impostos maiores - que a Suécia. O gigantesco estado de bem-estar
social sueco substituiu em grande parte a família como provedor. Ao
garantir emprego e renda para todos os cidadãos (incluindo
crianças), o estado de bem-estar social proporciona independência
para todos. Se torna muito mais fácil se divorciar do seu marido
quando o estado poderá te sustentar no lugar dele.
Os impostos
necessários para sustentar o estado de bem-estar social têm causado
um enorme impacto na estrutura familiar. Com impostos muito altos, as
mulheres precisam trabalhar, o que reduz o tempo disponível para a
criação dos filhos, impulsionando a expansão de um sistema de
creches, que se tornam responsáveis por grande parte do
desenvolvimento de quase todas crianças suecas com a idade superior
a um ano. Sob essas condições, se testemunha a realização ao
menos parcial do sonho de Simone de Beauvoir de uma androgenia
forçada que tira as mulheres de suas casas ao relegar a tarefa da
criação de seus filhos ao estado.
Mas ainda assim o
estado de bem-estar social sueco pode incentivar o traditionalismo em
um aspecto: a gravidez de adolescentes solteiras, comum entre as
classes mais baixas dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, é rara na
Suécia, que não possui uma classe mais baixa. Mesmo quando os
casais suecos têm um filho fora do casamento, eles tendem a residir
juntos quando a criança nasce. A forte presença estatal no sustento
do filho é um outro fator que desencoraja a maternidade entre
adolescentes solteiras. No entanto, não importando as causas, esse
desencorajamento da materninade solteira é um efeito de curto prazo.
Em última analise, pais e mães podem se manter financeiramente
sozinhos. Portanto, crianças que nascem fora do casamento crescem,
inicialmente, com dois pais que moram juntos, muitos deles se
separando mais tarde.
Existem ainda causas
cultural-ideológicas para a decadência da família sueca. Muito
mais do que no Estados Unidos, ideiais radicais de socialistas e
feministas impregnam as universidades e a mídia. Muitos cientistas
sociais escandinavos veem o casamento como uma barreira para a total
igualdade entre os sexos, e não seria nada lamentável ver o
casamento substituído pela coabitação de parceiros. Um importante
agente cultural-ideológico relacionado ao declínio do matrimônio é
o secularismo, e a Suécia é provavelmente o país mais secular do
mundo. Cientistas sociais seculares (a maioria deles muito radical)
vem substituindo amplamente os clérigos como árbitros da moralidade
pública. Os próprios suecos relacionam o declino do casamento com o
secularismo, e vários estudos estudos confirmam que, por todo o
ocidente, a religiosidade é associada com um casamento
institucionalmente forte, enquanto um alto grau de secularismo é
correlacionado com um enfraquecimento do casamento. Estudiosos tem
sugerido que a relativamente fraca cristianização dos países
nórdicos explica muito sobre porque o declínio do casamento na
escandinávia está uma década a frente do resto do ocidente.
Mas os escandinavos
estão cientes do aumento do número de nascimentos fora do
casamento, da deterioração matrimonial, e do constante crescimento
dos índices de dissolução familiar? Não, e sim. Por mais de 15
anos, um americano, o sociólogo da Universidade Rutgers David
Popenoe, tem alertado sobre essas questões. O livro de Popenoe,
"Disturbing the Nest", lançado em 1988, é ainda a obra
definitiva sobre as modificações na família escandinava e seus
significados para o mundo ocidental. Popenoe não é um conservador
previsível. Ele elogia o estado de bem-estar social sueco, e critica
a oposição feita pelos americanos para alguns dos programas de
assistência a crianças. Porém, Popenoe documentou o colapso em
slow motion da família sueca, e enfatizou a conecção entre a
deterioração da família sueca e as políticas de bem-estar.
Por anos, Popenoe
foi uma voz solitária. Ainda no fim dos anos 90, o problema era
muito óbvio para ser ignorado. Em 2000, o sociógo dinamarquês Mai
Heide Ottosen publicou um estudo, "Samboskab, Aegteskab og
Foraeldrebrud" ("Coabitação, Casamento e Rompimento
Parental"), que confrmou o amplo risco de dissolução familiar
para filhos de pais solteiros, e gentilmente repreendeu os cientistas
sociais escandinavos por ignorarem a "revolução silenciosa"
da paternidade fora do casamento.
Apesar da relutância
dos cientistas sociais escandinavos em estudar as consequências da
dissolução familiar para as crianças, existe um excelente estudo
que acompanhou as experiências de vida de todas as crianças
nascidas em Estocolmo no ano de 1953 (não por acaso, o estudo foi
conduzido por um pesquisador britânico, Duncan W.G. Timms.). Esse
estudo descobriu que, independente de renda ou status social, a
separação dos pais teve efeitos negativos na saúde mental. Garotos
morando com mães solteiras, separadas, ou divorciadas tiveram
particularmente maiores índices de deficiências na adolescência.
Uma importante pesquisa publicada em 2003 por Gunilla Ringbäck
Weitoft, em conjunto com outros pesquisadores, constatou que filhos
de pais solteiros na Suécia tem mais que o dobro das taxas de
mortalidade, morbidez grave, e lesões dos filhos que residem com os
dois pais. Esses dados se mostraram verdadeiros depois de examinados
em uma abrangente variedade de circunstâncias demográficas e
socioeconômicas.
O declínio do
casamento e a ascensão da coabitação instável e da natalidade
fora do matrimônio não estão limitados à Escandinávia. O estado
de bem-estar social nórdico agrava esses problemas, ainda que
nenhuma das forças que estão minando o casamento sejam exclusivas a
essa região. Contracepção, aborto, mulheres no mercado de
trabalho, secularismo fortemente disseminado, individualismo
ascendente, e um estado de bem-estar social substancial são
encontrados em todos os países ocidentais. Essa é a razão pela
qual o padrão nórdico está se espalhando, mesmo que de forma
desigual.
Pesquisadores
concordam que a tradição cultural tem um papel central em
determinar se um dado país caminha em direção ao sistema familiar
nórdico, e a religião é uma variável fundamental. Um estudo de
2002 do instituto Max Planck, por exemplo, concluiu que os países
com os menores índices de dissolução familiar e de natalidade fora
do casamento são "fortemente dominados pela confissão
católica." O mesmo estudo constatou que nos países com altos
níveis de dissolução familiar, a religião em geral, e
particularmente o catolicismo, tem pouca influência.
A demógrafa
britânica Kathleen Kiernan, uma autoridade reconhecida na
disseminação da coabitação e da natalidade fora do casamento pela
Europa, divide o continente em três zonas. Os países nórdicos são
os líderes em coabitação e natalidade fora do casamento. Eles são
seguidos por um grupo intermediário que inclui Holanda, Bélgica,
Grã-Bretanha e Alemanha. Até recentemente, a França fazia parte
deste grupo, no entanto as suas crecentes taxas de natalidade fora do
casamento a "promoveram" para a categoria nórdica. Os
índices norte-americanos de coabitação e natalidade fora do
casamento colocaram os Estados Unidos e o Canadá neste grupo
intermediário. Mais resistentes à essas mudanças na família
tradicional são os países do sul da Europa: Espanha, Portugal,
Itália, e Grécia, e, até pouco, Suíça e Irlanda (ascendentes
índices de natalidade fora do casamento na Irlanda a "promoveram"
ao grupo intermediário, semelhante ao ocorrido com a França).
Esses agrupamentos
acompanham de perto o movimento pró-casamento gay. No início dos
anos 90, o casamento gay chegou aos países nórdicos, onde a taxa de
natalidade fora do casamento já era alta. Dez anos depois, essa
mesma taxa aumentou significativamente nas nações do grupo
intermediário. Não por acaso, praticamente todos os países
pertencentes a esse grupo, senão legalizaram recentemente alguma
forma de casamento gay, estão pensando seriamente em fazê-lo.
Apenas no grupo com baixas taxas de natalidade fora do casamento o
movimento pró-casamento gay tem obtido relativamente pouco successo.
Isso sugere que o casamento gay é tanto um efeito quanto uma causa da crescente separação entre casamento e paternidade. Como as cada vez maiores taxas de natalidade fora do casamento desassocia o casamento heterossexual da paternidade, o casamento gay se torna concebível. Portanto, se o casamento é tão somente uma relação entre dois indivíduos, e não é intrinsecamente conectado à paternidade, porque a casais do mesmo sexo não deveria ser permitido o direito de se casar? Segue-se que, tão logo o casamento é redefinido para acomodar casais do mesmo sexo, essa mudança não é benéfica, pelo contrário, confirma e reforça a grande separação cultural entre casamento e paternidade que faz com que o casamento gay seja concebível, só para começar.
Nós vemos esse
processo em ação na radical separação entre casamento e
paternidade que se alastrou pela Escandinávia nos anos 90. Se as
taxas de natalidade fora do casamento escandinavas não fossem altas
já no final dos anos 80, o casamento gay teria muito mais
dificuldades para ser aceito . Mais de uma década após a
legalização da união gay na Escandinávia, as taxas de natalidade
fora do casamento passam dos 50%, e o efetivo fim do casamento como
um escudo protetor para as crianças se torna algo iminente. O
casamento gay não interrompeu a separação entre casamento e
paternidade, na realidade a acelerou.
Podemos ver esse
fenômeno mais claramente na Noruega. Em 1989, alguns anos depois da
Suécia quebrar paradigmas ao oferecer as primeiras medidas para a
união estável de casais gays na Europa, a Dinamarca legalizou o
casamento gay de facto, iniciando um debate na Noruega,
tradicionalmente mais conservadora que a Suécia e a Dinamarca, que
legalizou a união homossexual de fato em 1993 (A Suécia expandiu
suas medidas para um casamento gay de facto em 1994). Na Dinamarca
progressista, onde as taxas de natalidade fora do casamento já eram
muito altas, a população foi a favor do casamento homossexual. No
entanto, na Noruega, onde essas taxas eram menores - e a religião
tradicionalmente mais forte - o casamento gay foi imposto, contra a
vontade popular, pela elite política.
O debate norueguês
sobre o casamento gay, que ocorreu mais intensamente de 1991 a 1993,
foi um evento para uma mudança cultural. E, uma vez decretado, o
casamento gay teve um decisivo impacto anti-conservador no debate
cultural na Noruega, enfraquecendo os defensores do casamento
tradicional, e entregando uma arma nas mãos daqueles que buscam
substituir o matrimônio pela coabitação. Desde sua adoção, o
casamento gay trouxe divergências e declínio para a Igreja Luterana
da Noruega. Enquanto isso, com rápido crescimento das taxas de
natalidade fora do casamento norueguesas, essas ultrapassaram as
dinamarquesas. Particularmente na Noruega – outrora
relativativamente conservadora – o casamento gay minou o casamento
institucional ao tolerar todos.
A Igreja Luterana
Estatal da Noruega tem sido destroçada por conflitos desde a
aprovação do casamento gay de fato, com a regulamentação dos
membros registrados sendo a questão mais controversa. A agonia da
Igreja tem sido intensamente noticiada pela mídia norueguesa, que
aproveita cada oportunidade para mostrar a Igreja como algo rigído e
dividido. Os anos 90 começaram com os clérigos conservadores por
cima. Ao final da década, os progressistas tomaram as rédeas.
Enquanto a maioria
das disputas públicas nos anos 90 foram a respeito da
homossexualidade, a Igreja Luterana da Noruega estava também
dividida quanto a questão da coabitação heterossexual. Ao serem
perguntados diretamente, tanto os clérigos liberais quanto os
conservadores expressam uma preferência ao casamento em detrimento à
coabitação - especialmente para casais com filhos. Na prática,
entretanto, os clérigos conservadores protestavam contra a tendência
à coabitação e nascimento de filhos entre solteiros, enquanto os
liberais aquiesciam.
Essa divisão a
respeito da coabitação heterossexual se deu em 2000, no auge da
cisão da igreja sobre a união gay, quando o Príncipe Haakon,
herdeiro do trono norueguês, passou a morar com a sua namorada, uma
mãe solteira. Do início do controverso relacionalmento do príncipe
até seu eventual desfecho em um casamento, o futuro líder da igreja
estatal norueguesa recebeu sinais de apoio público ou de compreensão
dos mesmos bispos que lideraram a luta para permitir a ordenação de
parceiros homossexuais.
Portanto, mais do
que fortalecer o casamento norueguês contra a ascensão da
coabitação e dos nascimentos fora do casamento, o casamento
homossexual teve o efeito contrário. O casamento gay diminui a
autoridade da igreja ao dividi-la em dois grupos que brigam entre si
e ao prover a mídia secular com ocasiões para zombar e expor essa
divisão, além de também tornar a abertamente rebelde minoria
liberal da igreja reconhecida nacionalmente, permitindo aos
noruegueses a sentir que sua propensão para a paternidade solteira,
se não totalmente aprovada pela igreja, pelo menos não era
fortemente condenada. Se o “ponto de vista conservador” tinha
sido validado, os clérigos que eram favoráveis ao casamento gay
teriam recebido um forte apoio popular contra a paternidade solteira
heterossexual, mas isso não aconteceu. Foram os clérigos
conservadores que criticaram o príncipe, enquanto os liberais,
apoiadores do casamento gay, toleraram suas decisões. A mensagem foi
captada pelos noruegueses, que continuaram sua fuga à paternidade
solteira.
O casamento gay é
tanto um efeito quanto uma causa que reforça a separação entre
casamento e paternidade. Em países como a Suécia e a Dinamarca,
onde a taxa de natalidade fora do casamento já eram muito altas, e a
população apoiou o advento do casamento gay, as uniões
homossexuais foram um efeito dessas mudanças anteriores. Ao ser
legitimado, o casamento gay simbolicamente ratificou a separação
entre casamento e paternidade. E, uma vez estabelecido, a união
homossexual tornou-se um dos vários fatores que contribuíram para
mais aumentos nos índices de coabitação e de natalidade fora do
casamento, bem como de divórcios precoces, mas, na Noruega, onde as
taxas de natalidade fora do matrimônio eram menores, a religião
mais forte, e a população se opôs uniões de casais do mesmo sexo,
o casamento gay teve um papel muito maior no acelerado declínio
marital.
A posição da
Suécia como a líder mundial em declinío familiar é associada a um
clero frágil, e à proeminência de cientistas sociais seculares e
de esquerda. Nos anos 90 pós-casamento gay, com a taxa de natalidade
fora do casamento norueguesa, antes relativamente pequena, alcançando
níveis sem precedentes, e as controvérsias a respeito do casamento
enfraquecendo e dividindo a até então respeitada Igreja Estatal
Luterana, os cientistas sociais seculares tiveram um papel central.
Kari Moxnes, uma
socióloga feminista especializada em divórcios, é uma das mais
proeminentes do novo e emergente grupo norueguês de cientistas
sociais. Como uma pesquisadora que vê tanto o casamento quanto a
maternidade em casa como inerentes opressões às mulheres, Moxnes é
uma defensora da coabitação e da paternidade não-maritais. Em
1993, quando o legislativo norueguês estava debatendo o casamento
gay, Moxnes publicou um artigo, "Det tomme ekteskap"
("Casamento vazio"), no influente jornal de esquerda
Dagbladet. Ela argumentou que a união gay norueguesa era um sinal do
crescente enfraquecimento do casamento, e não do seu fortalecimento.
Embora Moxnes falasse em favor do casamento gay, ela tratou sua
criação como um (bem-vindo) toque de finados para o casamento em
si. Moxnes identificou os homossexuais – com suas experiências em
relacionamentos farsantes livres de filhos – como os pioneiros na
emancipação entre casamento e paternidade. Com o reconhecimento às
relações homossexuais, Moxnes disse que a sociedade estava
ratificando a divisão entre casamento e paternidade, o que
impulsionou o aumento no número de nascimentos fora do matrimônio
desde o início dessa aprovação.
Uma figura pública
frequente, Moxnes teve seu grande momento em 1999, quando ela estava
enrendada em uma disputa com Valgerd Svarstad Haugland, ministro de
assuntos familiares do governo democrata cristão norueguês. Moxnes
criticou as aulas sobre casamento cristão para ensinar as crianças
a importância dos votos de casamento. Essa crítica trouxe uma
nítida rejeição popular para Haugland. Respondendo às críticas
de Haugland, Moxnes citou as famílias homossexuais como a prova de
que os "relacionamentos" são hoje mais importantes que o
casamento institucional.
Isso não era o que
os defensores dos argumentos conservadores para o casamento gay
tinham em mente. Na Noruega, a união homossexual tem dado munição
para aqueles que desejam acabar com o casamento, e a constante
elevação da taxa de natalidade fora do matrimônio norueguesa
durante os anos 90 prova que os inimigos do casamento estão sendo
bem sucedidos. E Kari Moxnes tampouco é um caso isolado.
Meses antes do
conflito entre Moxnes e Haugland, a historiadora social Kari Melby
teve uma grande discussão pública com um líder do partido
Democrata Cristão sobre a conduta da ministra de energia da Noruega,
Marit Arnstad, que tinha ficado grávida no cargo e tinha se recusado
a revelar quem era o pai. Melby defendeu Arnstad, e desafiou
publicamente a crença que crianças estariam melhores com um pai e
uma mãe. Ao defender seu ponto de vista, Melby enalteceu a
paternidade gay, juntamente com a maternidade solteira voluntária,
como alternativas para a família tradicional igualmente válidas.
Então, em vez de apenas dizer que uma mãe grávida poderia querer
seguir o exemplo do casamento em que até mesmo gays foram agora
enquadrados, Melby citou as famílias homossexuais como a prova que
uma criança pode ficar tão bem com apenas um pai quanto com os
dois.
Finalmente,
considere um caso que teve muito mais repercusão na Noruega, em que
esteve envolvida a estrela do handebol Mia Hundvin (sim, o handebol
tem a proeza de criar celebridades na Noruega). Hundvin estava em uma
união gay legalizada com a também jogadora de handebol Camilla
Andersen. No entanto, ao ter sua bissexualidade revelada
publicamente, Hundvin foi ligada ao snowboarder norueguês Terje
Haakonsen. Inspirada pelo tempo passado com o filho de Haakonsen,
Hundvin decidiu ter um filho. O pai do filho de Hundvin pode muito
bem ser Haakonsen, mas nem Hundvin e nem Haakonsen confirmam.
Hundvin se divorciou
de sua parceira legal antes de decidir se tornar uma mãe solteira
com o seu (provavelmente) novo namorado? A história contada no
principal jornal norueguês, Aftenposten, não se preocupa em
mencionar este fato. Depois de notar que Hundvin e Andersen eram
parceiros legais, o jornal simplesmente disse que as duas mulheres
não estavam mais "romanticamente envolvidas”. Hundvin esteve
com Haakonsen apenas por um ano. Ela obviamente decidiu se tornar uma
mãe solteira sem se incomodar em ponderar se ela e Haakonsen
poderiam algum dia se casar. Hundvin também não parecia se
preocupar com o fato de que sua afeição pelo filho de Haakonsen
(aparentemente também nascido fora de um casamento) poderia ser
melhor demonstrada se ela se casasse com Haakonsen e se tornasse a
nova mãe do garoto.
Certamente, você
pode saber mais do que um pouco sobre essa saga para a cultura de
celebridades. Porém, a cultura de celebridades é tanto produto
quanto influência para a cultura maior que dá origem a isso.
Obviamente, a ideia da paternidade tem sido radicalmente
individualizada, e em última instância, desligada do casamento. As
uniões legalizadas tem reforçada tendências já existentes. A
imprensa trata as uniões gays mais como relacionamentos do que como
casamentos, e a mensagem simbólica que essas uniões passam – para
cientistas sociais, jogadores de handebol e bispos igualmente – é
a de que a maioria das famílias não-tradicionais são aceitáveis.
O casamento gay tem servido para validar a crença de que a escolha
individual está acima da formação familiar.
A experiência
escandinava refuta o tão comentado ponto de vista conservador em
favor do casamento gay de várias formas. Notável, também, é a
falta de um movimento a respeito do casamento e da monogamia entre os
gays. As taxas de registro de casais gays são excessivamente
pequenas. William Eskridge reconheceu isso quando relatou em 2000 que
2,372 casais se registraram após nove anos de legalização na
Dinamarca, 674 depois de quatro anos na Noruega, e 749 em quatro anos
na Suécia.
Desde a legalização
do divórcio nas primeiras décadas do século XX, os países
nórdicos têm sido a vangurda das modificações maritais. Tendo
como base a experiência sueca, Kathleen Kiernan, a já citada
demógrafa britânica, usa um modelo divido em quatro estágios pelo
qual pode-se avaliar o avanço de um país rumo aos níveis suecos de
natalidade fora do casamento.
No primeiro estágio,
a coabitação é vista como uma prática depravada ou de vanguarda,
e a grande maioria da população concebe filhos dentro do casamento.
A Itália está neste primeiro estágio. No segundo estágio, a
coabitação serve como um período de testes antes do casamento, e
geralmente é uma fase sem filhos. Tratando-se do problema da
paternidade solteira nas classes mais baixas, os Estados Unidos estão
majoritariamente nesta segunda fase. No terceiro estágio, a
coabitação se torna cada vez aceitável, e a paternidade já não é
mais automaticamente associada ao casamento. A Noruega estava neste
terceiro estágio mas, com as recentes mudanças demográficas e
legais, o país entrou no quarto estágio. Nesse estágio mais
avançado (onde estão Suécia e Dinamarca), casamento e coabitação
se tornaram praticamente indistinguíveis, com muitas crianças,
senão a maioria, nascendo e crescendo fora do casamento. De acordo
com Kiernan, esses estágios podem variar em sua duração, no
entanto uma vez que um país alcança um estágio, o retorno para uma
fase anterior é improvável. (Ela não citou exemplos de estágios
revertidos). E, embora estágios mais avançados tenham sido
atingidos, as fase anteriores coexistem.
As forças
empurrando os outros países para o modelo nórdico são quase
universais. Na verdade, ao preservar as distinções legais entre
casamento e coabitação, domar o estado de bem estar social, e
conservar ao menos alguns valores tradicionais, um dado país pode
evitar ou previnir a normalização da paternidade não-marital,
ainda que todos os países ocidentais sejam suscetíveis à
influência do modelo nórdico. Nem o catolicismo garante imunidade.
A Irlanda, possivelmente devido à sua proximidade geográfica,
linguística e cultural a Inglaterra, está agora sofrendo muito mais
com as taxas de natalidade fora do casamento do que o resto da Europa
Católica. Sem julgar essa mudança como inevitável, Kiernan se
pergunta quanto tempo os Estados Unidos podem resistir à chegada do
terceiro e do quarto estágios
Embora a Suécia
seja a líder mundial em declínio da família, os Estados Unidos é
o vice. Os suecos casam menos e criam mais crianças fora do
casamento do que qualquer outra nação industrializada. Porém, os
americanos são os líderes mundiais em paternidade solteira e
divórcio. Se nós pegarmos a crise de patenidade solteira entre
afro-americanos, o cenário é um pouco diferente. No entanto, mesmo
entre brancos não-latinos, os índices de divórcio americanos são
extremamente altos em relação aos padrões mundiais.
A combinação
americana de tradicionalismo e instabilidade familiar é incomum. Em
comparação à Europa, os americanos são mais religiosos e mais
inclinados a pedir ajuda da família do que do estado para uma amplo
leque de necessidades – desde cuidado dos filhos e dos parentes
mais velhos até suporte financeiro. Contudo, o individualismo
americano suprime as duas formas. Nosso libertarianismo cultural
defende a familia como um baluarte contra o estado, ainda que ela
também suprima a individualidade dos seus membros em seu favor. O
perigo que nós encaramos é uma combinação dos índices de
divórcio americano com o instável estilo escandinavo de paternidade
fora do casamento. Com uma crescente tendência de casais coabitantes
para terem filhos fora do casamento, os Estados Unidos estão rumando
nessa direção.
Os jovens americanos
são mais suscetíveis a aceitar o casamento gay do que os mais
velhos. Esse notório fato é diretamente relacionado a outro: menos
da metade dos americanos na faixa dos 20 anos de idade consideram
criar filhos fora do casamento algo errado. Existe uma ascendente
tendência para que até mesmo casais coabitantes de classe média
tenham filhos sem se casar.
No entanto, embora a
paternidade coabitante esteja crescendo nos EUA, os níveis aqui
continuam aquém dos europeus. A situação americana não é
diferente da noruguesa no início dos anos 90, com a religiosidade
relativamente forte, a taxa de natalidade ainda relativamente baixa
(mesmo que crescente), e com a população se opondo ao casamento
gay. Se, como na Noruega, o casamento gay for imposto aqui por uma
elite cultural esquerdista, isso provavelmte nos aceleraria na
passagem rumo ao clássico modelo nórdico de redução do casamento,
frequentes nascimentos fora do matrimônio, e crecimento exponencial
da dissolução familiar.
No contexto
americano, isso seria um desastre. Além de crescentes índices de
dissolução familiar da classe média, uma separação adicional
entre casamento e paternidade reverteria o saudável afastamento da
paternidade solteira que nós começamos a ver desde a reforma das
políticas estatais, e o declínio familiar geral traria intensa
pressão por uma nova expansão do estado de bem-estar social
americano.
Tudo isso está
acontecendo na Grã-Bretanha. Com o padrão nórdico se espalhando
pela Europa,a taxa de natalidade
fora do casamento britânica creseceu em 40%. Muito desse crescimento
se deve aos casais coabitantes, e um significante número desses
nascimentos na Grã-Bretanha são de adolescentes mães solteiras.
Isso acontece em função da divisão de classes britânica.
Lembre-se de que, embora o estado de bem-estar social escandinavo
estimule a dissolução familiar no longo prazo, a curto prazo os
pais escandinavos com filhos nascidos fora do casamento tendem a
continuar juntos. Porém, dada a presença de uma classe mais baixa
abundante na Grã-Bretanha, a disseminação da coabitação nórdica
por lá causou o crescimento dos indíces de maternidade em
adolescentes solteiras. Como os índices de paternidade solteira e
dissolução familiar têm crescido, então há uma pressão para a
expansão do estado de bem-estar social, para prover a ajuda
econômica que as famílias não podem mais dar. Mas, com certeza,
uma expansão do estado de bem-estar social apenas bloquearia o
enfraquecimento do sistema familiar em andamento.
Se os Estados Unidos
estão evitando fazer essa escolha, nós teremos que resistir a
separação entre casamento e paternidade. Contudo, ainda estamos
sendo empurrados para a direção escandinava. Estimulado pelas
crescentes taxas de paternidade solteira, o influente American Law
Institute (ALI) propôs uma série de reformas legais ("Princípios
da Dissolução Familiar"), projetadas para equalizar o
casamento e a coabitação. A adoção desses princípios seria um
grande passo em direção ao sistema escandinavo.
Os americanos
pressupoem que, apesar desses distúrbios recentes, o casamento
sempre existirá, o que é um erro. O casamento está desaparecendo
na Escandinávia, e as forças que o subjugam lá estão ativas em
todo o ocidente. Talvez o mais pertubador sinal para o futuro seja o
colapso da tendência dos escandinavos de se casarem após o
nascimento do segundo filho. No início dos anos 90, 60% dos pais
solteiros noruegueses que viviam juntos tinham apenas um filho. Em
2001, 56% dos pais solteiros coabitantes na Noruega tinham dois ou
mais filhos. Isso sugere que, em breve, os pais escandinavos podem
simplesmente parar de casar, não importa quantos filhos eles tenham.
A morte do casamento
não é inevitável. Em um dado país, decisões sobre políticas
públicas e valores culturais podem retardar, e talvez parar, o
processo de declínio marital. Tampouco estamos encarando uma escolha
de tudo ou nada entre o sistema marital da decáda de 50, por
exemplo, ou o desaparecimento do casamento. O modelo de Kiernan
estabelece pontos de paragem. Portanto, repelir o divórcio sem culpa,
ou mesmo eliminar a coabitação pré-conjugal, não é o que está em
questão. Com o divórcio sem culpa, os americanos jogaram fora parte
da estabilidade conjugal que protege os filhos de ganharem mais
liberdade dos adultos. Contudo, podemos aceitar essa troca, embora
continuemos assim traçando uma linha descendente rumo ao sistema
nórdico. Ainda, a coabitação como um fase de testes pré-casamento
não é o mesmo que a paternidade solteira. Potencialmente, uma
divisão entre os dois pode ser mostrada.
Os avanços nos
últimos 50 anos certamente enfraqueceram a ligação entre casamento
e paternidade. Ainda em uma situação admirável, os
americanos continuam pressupondo que pais devem casar. A Escandinávia
nos choca. Porém, quem pode negar que o casamento gay irá nos
acostumar a um estilo escandinavo de separação entre casamento e
paternidade? E, com nossas classes baixas, as patologias sociais que
essas mudanças produzem nos Estados Unidos estão destinadas a serem
mais graves do que elas já são na rica e socialmente homogênea
Escandinávia.
Todas essas
considerações sugerem que imergir-se na discussão sobre o
casamento gay nos EUA é muito importante. Kiernan afirma que, embora
as sociedades progressivamente desmembrem o casamento da paternidade,
reverter esse processo é impossível. O que faz sentido, já que a
associação entre o casamento e a paternidade é um tanto quanto
mística, e místicas desfeitas não podem ser restituídas sob
demanda.
Que tal uma mistura
em que alguns estados americanos legalizam o casamento gay enquanto
outros não? Uma diversidade entre os estados praticamente
garantiria uma mudança para o sistema familiar nórdico. O cinema e
a televisão, que não respeitam as fronteiras entre os estados,
abraçariam o casamento gay, e os efeitos culturais seriam nacionais.
E as uniões civis
como acontecem em Vermont? Elas seriam um compromisso um acordo
viável ? Obviamente não. As uniões legalizadas escandinavas são
uniões civis ao estilo de Vermont. Elas não são chamadas de
casamento, ainda que se assemelhe ao casamento em quase todos os
outros aspectos. As principais diferenças são que as uniões
legalizadas não permitem adoção ou inseminação artificial, e não
podem ser celebradas em igrejas filiadas ao Estado. Essas limitações
estão sendo gradativamente eliminadas. A lição a respeito da
experiência escandinava é que até o casamento homossexual mina o
casamento tradicional.
O exemplo
escandinavo também prova que o casamento gay não é o casamento
interracial em uma nova aparência. A analogia à miscigenação
nunca foi convincente. Existem várias razões para se pensar que,
diferentemente da raça, a orientação sexual causará profundos
efeitos no casamento. No entanto, com a Escandinávia, nós estamos
muito além da esfera da especulação educada sobre o assunto. As
mudanças pós-casamento gay na família escandinava são
signifcantes, não algo como fantasiar sobre os defeitos em crianças
filhas de um casal onde os pais têm raças diferentes. Existe um
debate sério sobre a disseminação do padrão familiar nórdico.
Uma vez que o casamento gay é parte deste padrão, é necessário
que ele faça parte do debate.
Os defensores
conservadores do casamento gay querem testá-lo em alguns estados. A
implicação é que, caso o experimento dê errado, nós podemos
anulá-lo. Já os efeitos, mesmo que em alguns estados, não serão
contíveis ou revogáveis. Foram necessários cerca de 15 anos após
as modificações acontecerem na Suécia e na Dinamarca para as taxas
de natalidade fora do casamento norueguesas começarem a mudar do
nível “europeu” para o “nórdico”. E foram necessários
outros 15 anos (e após o advento do casamento gay) para que essas
mesmas taxas norueguesas ultrapassassem as taxas dinarmaquesas.
Quando nós vermos os efeitos do casamento do casamento gay nos EUA,
será tarde de mais para fazer qualquer coisa. No entanto, não é
preciso esperar tanto. Com efeito, a Escandinávia realizou o
experimento para nós, e os resultados estão aí.
Stanley Kurtz é
pesquisador na Hoover Institution. Seu "Beyond Gay Marriage"
foi publicado na edição de 4 de agosto de 2003 da revista Weekly
Standard.
* * * * *
[*] Tradução: Paladino
[*] Tradução: Paladino
Texto de grande excelência.
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